sexta-feira, 27 de abril de 2007

Três...

Prendes-me com o olhar
e com a flecha que cravas
na emoção do ser que há em mim...

Abre-se um rebento de flor
no meu diafragma trespassado,
que libera uma libélula azul-prateado,
adejando sobre o propulsor do meu sangue,
ascendendo em espiral
sobre as vertebras
na direcção do olhar interior,
do tufão que conduz ao infinito...

Sabes e fazes isso.
Mas repulsas-me com palavras
e supostos sentimentos
que não revelas transmitir.

Essa flecha divide-me...
Por um lado, sereno e ausente,
impaciente por outro, exaltado...

E assim me quedo, dividido,
a observar os diferentes caminhos
que percorre cada uma das partes.

No fundo, até fico agradecido...
Feliz por absorver novo nectar.

É esse sumo que me faz falta,
quero beber...

quinta-feira, 26 de abril de 2007

Ultimamente...

Quando a luz chove radiante
pelas manhãs tranquilas,
ou quando incide perpendicular
sobre meus ombros caídos,
sinto vazio meu corpo,
despido da alma fugidia
que teima em se desprender,
deslocar, ausentar.

Tudo se repete quando
o lençol nocturno abrange o céu
do meu pequeno mundo.
Vazio meu corpo, despido da alma
que teu rosto persegue,
que a tua alma encontra,
abraça e reflecte.

Vazio meu corpo dormente
da mente pensante,
de ti sonhadora e amante
que no teu olhar se prende e pretende...

quarta-feira, 25 de abril de 2007

A luz que procuro...

Sou prisioneiro desta emoção
que me faz tremer de medo
e que me faz sentir a vida ardente
escondida no peito.

Ensina-me, meu amor,
aquilo que não sabes ainda,
o grão de farinha branca
que apreendes sem saber
e possuis sem conhecer.
É essa partícula da verdade
que necessito absorver.

Minha mestra preserverante,
sei que devo serenar meu coração,
mas como posso fazê-lo
se os meus sentidos se apuram
quando te adivinham por perto?

Como posso fazê-lo
quando aquilo que sinto por ti
me faz contemplar a tua perfeição?

Sou forçado, minha paixão,
a dar-te asas para voar,
porque desconheço a liberdade
quando contigo não me encontro
e não te quero aprisionar.

Quando não te abraço
fico preso à tua imagem.
Mas se não te amo, tampouco te possuo
e pode em mim voar serenamente a liberdade.

Se me fizeres compreender
este pontinho de luz que me falta alumiar,
tornarme-ei um ser maior
e os meus olhos abrangerão
mais amplamente o horizonte.

Só dessa forma te poderei amar
e sentir a liberdade.
Essa mesma ave que sinto
sobrevoar as planícies
da perfeição interna.

A doçe vibração divina
que me abraça de vez em quando,
deixando sereno meu peito,
minha mente em silêncio,
meu corpo relaxado
e minh'alma preenchida.

Desfragmentado meu ser se queda,
unido à harmonia natural da vida,
fluindo em paz radiante.

Assim te quero amar,
silenciosamente e em paz.
Com amizade e confiança,
livremente na verdade,
por mútua evolução
de extasiante presença.

Quero amar-te por realidade,
sem angústia nem expectativa.

Ensina-me mestra, portanto,
o que é iminente aprender,
pois quero amar-te na eternidade,
sentindo a vida que hoje canto,
quero amar-te sem sofrer.

quarta-feira, 18 de abril de 2007

A Luzinha...

A Luzinha apareceu assim, do nada, mais ninguém deu por ela ali, esvoaçante e pequenina à saída da estação terminal, em S. Bento, no Porto.

Era um desses dias de abril, talvez o decimo oitavo... Um desses em que o sol brilhava quase como no verão. Mas o pólen irritava-me o nariz, por ser abril e por a brisa me acariciar assim, suavemente.

A minha Salvação foi lembrar-me de ir para o rio, onde o polen ja vinha fresquinho. Ela esvoaçava ao meu lado. Não me disse de onde veio mas eu percebi logo que viera das estrelas. Notava-se pela forma de andar e pela maneira como piscava os olhos. Mas só tive a certeza disso quando ela me contou que conhecera o princepezinho, ele que morava - sabia eu - num planeta distante, perto das estrelas. Quando me contou isso, eu vi fosforescer um brilho distante nos seus olhos azuis clarinhos, que alumiou as sardas pequeninas do seu rosto esguio de pele clarinha. E nesse instante eu tive a certeza.

O sol estava a descer vermelho sobre a foz, deixando o céu de uma cor vibrante, deixando as casas de uma cor vibrante, deixando-me a mim vibrante, mas de uma cor diferente, ainda mais intensa por receber os brilhozinhos que a Luzinha me enviava. Pairava alegria à nossa volta e gaivotas.

Depois disso ela despediu-se de mim, dizendo que tinha de ir visitar a mãe que morava no centro da terra. Uma senhora muito responsável, que tinha de manter o centro da terra bem quente e limpinho, para que nós, os seres humanos pudessemos viver a nossa vida descansadinhos, sem que nenhum vulcão irrompesse assim no meio de nenhures. E então, lá foi ela. Assim como apareceu, desapareceu também para debaixo da terra, mas não sem antes me dizer que depois de visitar a mãe nos voltariamos a encontrar.

terça-feira, 10 de abril de 2007

O estranho...

No meu inconsciente mora um estranho, escondido, e nunca se mostra a ninguém. Por vezes procuro avistá-lo em algum espaço recondito da maquina de pensar e, esporadicamente, reconheço o seu vulto entre a escuridão, esgueirando-se pela confusão e o pó do velho sótão.
Não o conheço. Não posso falar dele. Mas já me tem acontecido entrever os seus olhos, no olhar de alguém. Nalgum desses mestres que me falam todos os dias, alguns conhecidos, amigos, alguns desconhecidos, por vezes até inimigos.
Sim, por vezes dou por mim a pensar que o meu estranho conheçe o mundo melhor que eu, conhece os outros melhor que eu, conhece-me melhor. Aos pouquinhos vou percebendo melhor a sua essência, mas nunca o entrevi numa mirada. Nunca compreendi as suas palavras, nem apreendi a sua totalidade. É como se ele se dividisse em fragmentos que completam o meu âmago. Mas o meu ser parece tão pequenino à medida que vou iluminando esses pedaçinhos de sombra, no intuito de crescer...

quinta-feira, 5 de abril de 2007

Num lance de paz

Perto do momento laranja
em que a luz mergulha
profundamente no vasto oceano,
sentindo a brisa no corpo
e seu perfume de algas,
descanso minh'alma no voo eterno
que este horizonte desprende.

Perplexo se estagna meu ser
por apreender o estrondoso amor
que o mar demonstra à terra,
envolvendo os rochedos num beijo.

Tão pequeno me vejo,
palpitante meu peito
extasiado de amor e respeito.

Respirando orvalhos ao vento,
acalmo a ansiedade interna
porquanto o universo me embala.
Em proveito desse esplendor colossal
chove sobre mim o alento da vida
e eu sorrio enquanto o silêncio brota
como um rebento de flor adormecida.

terça-feira, 3 de abril de 2007

...

A eternidade não tem data,
não tem fim, não tem início.

A eternidade arde eterna na lama
onde me tenho escondido.

Porquê existir?
Posso bem morrer sozinho!
Sei que não tenho de ser…

Nem de dar
ou viver o que tenho a perder:
esse imenso que faz chorar.

Mas também sei que posso... Sim!
Tenho o poder
Trata-se apenas de uma pequena escolha.

Escuta…

Escuta este canto baixinho… O vento…
Consegues ouvir?

E sentir o odor da confiança
quando ela é inabalável,
e o mundo e as estepes
e as formigas se prostram a teus pés,
com dignidade e alegria,
com humildade e amor ardente…

Sei que esperas dormente,
sei tudo o que tu sabes,
porque sou eu também
quem espera solitário e impaciente
por entre as valas cavadas na terra,
os risos que sucumbem na guerra,
veias de fogo em torrente.

Mas olha… Vê:

O caudal do rio crescente,
Impotente quando nasce tão doce na fonte,
mas termina colossal e salgado
num horizonte potente, alargado…

Junto à luz sagrada que adormece
e levanta alvorada de amanhã a nascente…

A eternidade não tem ontem, nem amanhã…